Autora: Isabella Tamaki

Revisora: Ana Rafaela Nascimento

Desde 2022, com a reforma constitucional, o voto passou a ser obrigatório no Chile. Segundo dados do Serviço Eleitoral do Chile (Servel), cerca de 89% da população compareceu às urnas para as eleições regionais, que definem os prefeitos, vereadores, além de governadores regionais e líderes regionais.
A coalizão de esquerda liderada pelo atual presidente do Chile sofreu uma derrota, conquistando 111 prefeituras das 345 em disputa, contra 122 que serão ocupadas pelo Chile Vamos, grupo da direita tradicional. No entanto, de acordo com a análise de especialistas, os setores conservadores conquistaram menos cadeiras do que se era esperado, sobretudo o Partido Republicano. O partido de extrema-direita ficou com 8 prefeituras, muito atrás das candidaturas independentes, que conseguiram 103 cadeiras.
A derrota expressiva do Partido Republicano foi uma surpresa, dado que o partido foi maioria no Conselho Constitucional, conseguindo aprovar uma emenda de caráter conservador à atual Carta Magna chilena, em 2023. Esperava-se que o bom desempenho da extrema-direita se repetisse nas eleições regionais e, posteriormente, nas eleições presidenciais. Porém, a última votação demonstrou que o futuro político chileno é bastante incerto, com as dinâmicas de poder se alterando a todo instante, ora a favor dos progressistas, ora com a vitória dos setores conservadores de direita.

A tentativa de aprovação de uma nova Constituição do Chile

Para a melhor compreensão da conjuntura política chilena, é preciso retornar ao ano de 2019, quando o Chile passou por uma onda de protestos populares que tomaram Santiago e outras cidades. Essas manifestações culminam em um processo constituinte que buscava a aprovação de uma nova Constituição para o país, visto que a atual Carta Magna chilena é aquela outorgada em 1980, durante o regime militar de Augusto Pinochet.

Foto: Reprodução | celag Data

De um lado, as forças progressistas eram a favor de uma nova Constituição, que rompesse com o modelo neoliberal (intensificado durante a ditadura militar) e  incluísse uma ampliação de direitos para mulheres, pessoas indígenas e populações marginalizadas. De outro, os setores de direita buscavam conservar a Constituição vigente. O primeiro passo para a tentativa de aprovação de uma nova Carta Magna começa com as escolhas para a Convenção Constitucional, responsável pela redação de um novo texto constitucional. 

Na Convenção Constitucional, destaca-se a participação igualitária entre homens e mulheres, além da representação indígena, resultando em um texto de caráter progressista. Mas, o que parecia ser uma vitória para a esquerda, logo se tornou uma derrota com a rejeição da população à Constituição proposta pela Convenção Constitucional. Com mais de 13 milhões de votos,  61,89% dos eleitores votaram contra o novo texto. 

Na sequência, realizou-se uma eleição para a composição de um Conselho Constitucional, com representantes para propor uma nova Constituição a ser votada. Dessa vez, a direita e os setores conservadores, sobretudo o Partido Republicano, ganham a maioria das cadeiras para redigir um novo texto constitucional.  Ocorre novo plebiscito, realizado em 17 de dezembro de 2023. O resultado foi, novamente, a rejeição, com 55,79% dos votos contrários. 

Foto: Reprodução | LVQS/María Elisa Quinteros

A rejeição foi encorajada pela esquerda por se tratar de um texto elaborado majoritariamente pelos setores conservadores, que não atendia às pautas e demandas progressistas. Depois do resultado, o presidente Gabriel Boric declarou que o processo constituinte no Chile estava encerrado em seu mandato.

Observa-se, então, uma contradição, já que, no início, os setores de direita buscavam manter a Constituição atual e, ao final do processo constituinte, eles tentavam aprovar uma nova Carta Magna, mas com um texto de caráter conservador. Ou seja, independentemente do resultado, seria uma vitória para a direita chilena. Além disso, as reivindicações populares por uma nova Constituição, emergidas em 2019 durante os protestos históricos contra o regime neoliberal e em demanda da ampliação de direitos sociais, não atingiram os resultados esperados.

Porém, ao longo de todo o processo constituinte, foi possível apontar algumas conquistas momentâneas da esquerda, como a eleição de Gabriel Boric, representante da esquerda, à presidência e a paridade de gênero e participação indígena na Convenção Constitucional.

Sendo assim, a derrota, tanto do Partido Republicano, como da coalizão de esquerda de Boric — principais atores e forças do processo constituinte — nas eleições regionais do Chile, tornam o cenário político chileno ainda mais imprevisível para as eleições presidenciais que ocorrem no ano que vem.*

*Texto adaptado de uma análise de conjuntura realizada para a disciplina de Formação Histórica da América Latina, do curso de Relações Internacionais da UNESP.


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