Autor: Luís Faria e Valentin Kondratiuk

O atual presidente do Equador, o banqueiro Guillermo Lasso, foi eleito em 2021 para cumprir
um mandato por quatro anos. No entanto, a constituição do país em seu artigo 148 prevê um
mecanismo conhecido popularmente como Muerte Cruzada (morte cruzada), que outorga ao
presidente da república o poder de dissolver a Assembleia Nacional equatoriana, convocando novas eleições. Entretanto, ao utilizar-se do mecanismo constitucional, o presidente encerra também o seu mandato de forma prematura, pois a Carta Magna prevê que eleições presidenciais sejam realizadas junto às legislativas, por isso o nome de “morte cruzada”. Desde que a nova constituição foi promulgada em 2008, nenhum chefe de governo havia utilizado do artifício.


Todavia, Lasso que enfrenta baixas históricas em sua popularidade, graves denúncias de
corrupção e, principalmente, um julgamento político em andamento que poderia resultar em seu impeachment, optou pela manobra para interromper os procedimentos legislativos que o
investigavam. Assim, o Conselho Nacional Eleitoral convocou novas eleições, cujo primeiro turno se deu no dia 20 de agosto.


A CORRIDA PRESIDENCIAL
Um dos principais tópicos discutidos ao longo das campanhas eleitorais foi a questão da
segurança pública. O Equador viu nos últimos anos uma escalada acentuada nos índices de violência que representam uma crise de segurança pública sem precedentes no século XXI. Estatísticas policiais revelaram que entre janeiro e junho de 2023 foi registrado um aumento de 58% de assassinatos em comparação com o mesmo período de 2022. Esta crise de segurança pública é agravada pela crescente presença do narcotráfico no país e pelas altas taxas de insegurança alimentar. Assim, o eleitor equatoriano busca nos candidatos respostas para esta grave crise que acomete o país andino. Ademais, o clima político no país está bastante conturbado e atingiu seu ápice com o assassinato do candidato Fernando Villavicencio em 9 de agosto. Este incidente deixou as forças de segurança em alerta fazendo com que diversos locais de votação contassem com a presença de militares armados. Os candidatos também tomaram medidas de precaução e foram frequentemente vistos utilizando coletes a prova de balas.

Além da violência, este primeiro turno foi também marcado negativamente por problemas
organizacionais, um exemplo disso foi a dificuldade na apuração dos votos vindos de cidadãos
equatorianos vivendo no exterior. Segundo a presidenta do Conselho Nacional Eleitoral Diana
Atamaint, estas complicações foram resultado de ciberataques.


O primeiro turno ocorreu em 20 de agosto, os dois candidatos mais votados foram Luisa
Gonzales do Movimiento Revolucion Ciudadana e Daniel Noboa da ADN, os dois disputarão o
segundo turno no dia 15 de outubro. O atual presidente Guillermo Lasso não deu, até o momento, nenhuma manifestação de respaldo a nenhum dos candidatos. Entretanto, ele é uma figura associada ao anti-correismo, que também fazem parte Daniel Noboa e seu pai Álvaro, que chegou a publicar um vídeo em apoio a políticas de Guillermo Lasso em 2021. Sendo assim, é possível inferir uma maior proximidade ideológica entre Lasso e o clã Noboa, mesmo sem declarações explícitas por parte do atual chefe de estado.


LUISA GONZALEZ – MOVIMIENTO REVOLUCIÓN CIUDADANA


Luisa Gonzalez nasceu em 1977, na capital Quito, mas cresceu na província de Manabí. É
uma advogada formada pela Universidade Internacional do Equador, e conta com dois mestrados, um em alta gestão pelo Instituto de Altos Estudos Nacionais e o outro em economia internacional e desenvolvimento pela Universidade Complutense de Madrid.


A carreira política de Gonzalez está fortemente ligada ao controverso ex-presidente Rafael
Correa, um dos precursores da chamada “onda rosa” sulamericana, momento no início do século em que diversos governos de centro-esquerda foram eleitos na região. Correa atualmente está em condição de asilo político na Bélgica, pois foi condenado à prisão pela justiça equatoriana, sentença considerada por seus simpatizantes como perseguição política. Luisa Gonzalez ocupou diversos cargos ao longo dos mandatos de Rafael Correa e ocupou um assento na Assembleia Nacional por dois anos.


Em 2023, o partido fundado por Rafael Correa lançou a candidatura de Gonzalez após a
recusa do ex vice-presidente Jorge Glas em concorrer ao cargo. No primeiro turno recebeu 3,3
milhões de votos, o que corresponde a cerca de um terço do eleitorado. Este resultado a colocou em primeiro lugar, porém não foi suficiente para a eleger, qualificando-a para o embate direto com Daniel Noboa no segundo turno, a ser realizado no dia 15 de outubro. A alta porcentagem de votos desta política relativamente desconhecida se deve à sua associação ao movimento do correísmo, entretanto esta também pode ser sua maior fraqueza, uma vez que há grande rejeição a esta corrente política e portanto os votos dos candidatos derrotados no primeiro turno podem passar para Daniel Noboa no segundo turno: dos ex-presidenciáveis, Zurita e Jan Topic, terceiro e quarto lugares respectivamente, já declararam seu apoio à candidatura de Noboa.


● PROMESSAS DE CAMPANHA
○ Maior controle sobre as empresas de transporte em plataformas digitais para evitar a
precarização laboral
○ Promoção de maior igualdade de gênero nas instituições de segurança
○ Recuperar instituições como o Ministério da Coordenação de Segurança e o
Ministério da Justiça
○ Perdoar dívidas de até 10000 dólares do setor agropecuário
○ Estabelecer programas de reabilitação social
○ Fortalecimento das universidades públicas


DANIEL NOBOA – ACCION DEMOCRATICA NACIONAL

Nascido em Guayaquil em 1987, o jovem Daniel Noboa é herdeiro de um império bananeiro.
Seu pai, Álvaro Noboa, conhecido como “Magnata da Banana” é o homem mais rico do Equador e, além de chefiar o Grupo Noboa, um grande conglomerado de empresas com presença internacional, já se candidatou à presidência da república em cinco ocasiões diferentes (1998, 2002, 2009 e 2013), nunca logrando êxito.


Formado em administração pela Universidade de Nova Iorque e mestre em administração
pública por Harvard, Noboa iniciou sua carreira política em 2021, quando se elegeu membro da
Assembleia Nacional pelo Movimento Ecuatoriano Unido. Enquanto congressista, Noboa teve baixa produtividade, sendo seu mandato marcado por uma discreta produção legislativa, inclusive com significativa ausência em votações. Ainda em 2021, assumiu a presidência da Comissão de Desenvolvimento Econômico, onde serviu como importante aliado do governo do então presidente Guillermo Lasso.


Em 2023 Noboa se candidatou para a presidência da república pela coalizão política Accion
Democratica Nacional. No primeiro turno, recebeu cerca de 2,3 milhões de votos, aproximadamente 23% do eleitorado. Esse resultado garantiu sua ida ao segundo turno. O êxito eleitoral deste primeiro turno foi bastante surpreendente pois cerca de 11 dias antes da eleição, pesquisas indicavam Noboa como apenas o sétimo candidato com mais intenções de voto. Sua candidata a vice-presidência é Verónica Abad, política e empresária considerada ultra conservadora e admiradora de Jair Bolsonaro e Javier Milei.


● PROMESSAS DE CAMPANHA
○ Foco em segurança pública
○ Militarização das fronteiras e de portos
○ Foco em criação de empregos
○ Consulta pública sobre diversos temas, entre eles, a reforma do judiciário, o
papel das forças armadas, entre outros
○ Criação de uma agência central de inteligência independente da polícia e do
exército

O QUE ESPERAR DESSAS ELEIÇÕES?
De modo geral, não se deve esperar mudanças impactantes ou profundas no panorama político equatoriano. As eleições presidenciais de 2023 no Equador são bastante familiares aos
latino-americanos: de um lado, uma figura política pouco expressiva de centro-esquerda impulsionada por sua associação a uma personagem carismática e conhecida da política nacional e, de outro, um candidato de direita associado à e membro da elite do país. Além disso, é necessário ressaltar o caráter “tampão” que o pleito presidencial de 2023 terá, uma vez que o vencedor ocupará o cargo somente até 2025.


Contudo, é importante reconhecer que as eleições equatorianas podem servir como um prelúdio de um projeto político mais longevo. Se, de um lado, a vitória de Noboa consolidaria o anti-correismo como a tendência dominante no país; uma vitória de Gonzalez traria de volta a corrente ao Palácio de Carondelet, residência presidencial do Equador. Ademais, os possíveis resultados imediatos produzidos pelo novo governo nesse curto mandato podem influenciar a opinião pública para as próximas eleições em 2025.


3 comentários

Matheus · outubro 14, 2023 às 5:30 pm

Muito bom!

Rubens Faria · outubro 14, 2023 às 11:24 pm

Artigo muito bem escrito, permitindo que um leigo no tema, como eu, conseguisse compreender o que se passa neste país andino pouco conhecido pela grande maioria dos brasileiros.

דירות דיסקרטיות בבאר דשבע · novembro 9, 2023 às 6:39 am

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